Por que cantoras?

24/03/2015 15:12

            Era o início do happy hour. Eu e outros quatro amigos estavamos na mesa da churrascaria, com a missão de esquecer tudo o que foi a cansativa semana e se descontrair da melhor forma possível. Tive de ficar de fora da rodada de cerveja, uma vez em que tive a infelicidade de ser o motorista do grupo, embora tenha me contentado com o refrigerante de guaraná.

            Começamos falando sobre viagens, passeamos brevemente por futebol, salvo as discussões de sempre sobre juízes facilitando os jogos dos grandes times. E como não fosse diferente, encerrava no assunto dos quais vários homens dizem ser especialistas, mas o que entendem não chega a ser uma virgula da vasta enciclopédia: Mulheres.

            Nesse exato momento até que se acabe a discussão, ninguém tem namorada, amante ou esposa. Todos são observadores do objeto de estudo, cada um com sua opinião estruturada de como seria a mulher perfeita. Mediana como um tamanho padrão, ou quem sabe um pouco baixinha, não se fala muito das altas. Os cabelos também variam em todas as combinações de formas, tamanhos e cores possíveis, finalizando com uma discussão sobre o perfil. Não demorou muito e acabou chegando a vez do mais calado, isto é, eu...

- Fala ai Renato - disse um deles - Como é que ia ser a mulher perfeita na tua opinião?

            Comecei então a discorrer sobre a única qualidade que eu repararia em uma mulher e que certamente me levaria a dividir uma vida com ela. Não me importava tanto com os padrões de beleza ali estabelecidos, afinal, daquela conversa não havia saido mulheres que não fossem dignas de participar de um concurso de miss universo. Felizmente meu padrão não era tão alto assim, embora fosse compensado pela raridade da característica que eu procuraria: tinha de ser cantora.

- Cantora?! - disseram todos - O que tem a ver? - disse o mesmo amigo de antes.

            Também já me fiz e refiz esta pergunta várias vezes, embora só agora tenha discernimento o suficiente para preceber que apenas uma cantora me aturaria porque eu seria o único capaz de aturá-la. Vamos aos fatos, primeiro que sou escritor nas horas vagas, o que acaba por fazer com que todos os que estão próximos a mim tenham de ler meus textos e dizer o que acharam quase que sobre tortura. Casar com uma cantora significa que ela vai ter de ler meus textos da mesma forma que eu terei de ouvi-la cantar pelo resto da vida. Por isso batalho para me tornar um ótimo escritor que seduz com poucas palavras e mantem a mente do leitor viciada em outros textos, e rezo para encontrar alguma mulher que cante bem, porque seria um casamento trágico, uma mulher que vive lendo textos que mais parecem bula de remédio e um homem que ouve a esposa cantar e acha que estão estrangulando algum gato.

            O segundo motivo, envolve um fator econômico: O violão de 300 reais que comprei há três anos. Só aprendi a tocar músicas básicas naquele troço e minha voz é horrível, de forma que não dá para fazer nenhuma versão instrumental e nem apresentar alguma música conhecida. Mas certamente ficaria feliz em prestar acessoria sempre que minha esposa cantora quisesse.

            Se por acaso tivessemos um filho, ou uma filha e na melhor das hipóteses um casal de gêmeos, ela os colocaria para dormir com uma canção de ninar, e eles cresceriam lendo livros infantis escritos por mim mesmo, mas sem deixar de lado os clássicos. No auge de nossas carreiras, eu seria premiado com algum grande prêmio da literatura nacional com algum best-seller e ela alcançaria os topos da parada de sucesso com um disco de ouro. E assim seria até o último de nossos dias...

- Cara... - disse o tal amigo - Impressionante, sabia que a Flavinha lá do escritório canta num karaokê aqui perto?

- Sério? - questionei-o

- Se quiser eu te passo o número dela e vocês combinam alguma coisa.

- Quero sim - respondi com entusiasmo - pode mandar!

            E assim acabava aquela reunião. Era hora de aproveitar o fim de semana e segunda feira retornar ao batente. O que aconteceu entre eu e a Flavinha? Conto para vocês em uma próxima oportunidade.

 

P.s: Na verdade, quando chamei a Flavinha para sair, ela disse que tinha namorado. Felizmente apareceu a Kátia, da repartição, que conheci enquanto ela enchia o copo de café na sala de confraternização da empresa e cantarolava "sweet child o' mine" do Guns N' Roses, ela não era tão mal assim, e tinha até uma certa beleza, embora fosse extremamente discreta. Ela disse gostar de ler e pareceu interessada quando eu disse ser escritor, espero que isso seja um sinal verde do destino mostrando que minhas preces foram atendidas... Seja o que Deus quiser...

 

Neudson Nicasio